Sócia Rossana Fonseca comenta sobre os falsos entregadores que assustam os paulistanos em nova modalidade de crime
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Falsos entregadores assustam paulistanos; polícia faz operações diárias para tentar coibir roubos
Nova modalidade de crime passou a chamar mais atenção após a morte de Renan Loureiro, de 20 anos, no final de abril, em cena gravada por câmeras de segurança
Por Pedro Jordão 15/05/2022 08h00
No texto anterior desta série de reportagem sobre problemas que a cidade de São Paulo enfrenta atualmente, tratamos sobre o aumento da violência e da sensação de insegurança da população. Segundo o especialista em segurança pública da Universidade de São Paulo (USP) Bruno Paes Manso, o crescimento do medo na capital paulista é consequência principalmente do aumento no número de furtos no centro em relação a 2021, quando houve uma queda por causa da pandemia da Covid-19. Entretanto, uma nova modalidade de furtos e assaltos chama a atenção neste ano de 2022: os realizados por “falsos entregadores” de aplicativos. Com mochilas-baú, muitas vezes estampando emblemas de empresas de delivery conhecidas, eles conseguem simular maior naturalidade perto das vítimas, surpreendendo-as nas abordagens, armadas ou não. A polícia diz se articular e afirma que realiza operações diárias para tentar coibir nova modalidade de crime.
O jornalista Túlio da Silva [nome fictício], de 27 anos, que preferiu não se identificar por considerar a situação e o assunto desconfortáveis, foi uma das pessoas abordadas por falsos entregadores recentemente. Ele conta que três homens em motocicletas, se passando por profissionais de entrega de delivery, se aproximaram dele por volta das 22 horas, quando estava sozinho, na Alameda Campinas, no Jardim Paulista, no centro de São Paulo. “Se eram entregadores mesmo ou não, não sei. Só sei que estavam de moto, com uma mochila-baú vermelha do iFood cada um. Eles simplesmente chegaram e já foram pedindo o celular. Não reduziram a velocidade, só chegaram na minha frente rapidamente. Não sei se estavam armados. Eu percebi que era um assalto, vi uma brecha para sair dali e fui correndo como um louco, por isso não conseguiram levar nada”, relembra. Segundo o jovem, a tentativa de assalto ocorreu na altura da filial da Starbucks, bem próximo à Avenida Paulista, e não havia muitas pessoas por perto.
Segundo o delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo, Osvaldo Nico Gonçalves, responsável por investigar os casos de assaltos por falsos entregadores, operações diárias estão sendo realizadas na capital paulista para tentar evitar e coibir tais crimes. “Estamos fazendo operações diárias, com blitz, para identificar falsos entregadores. Também estamos em contato com os aplicativos de entrega para, por meio da tecnologia e dentro da lei, identificarmos possíveis desvios do uso correto da ferramenta. Além disso, ainda estamos nos comunicando com entregadores, para nos informarem sempre que identificarem pessoas desconhecidas ou estranhas entre eles”, relata.
“No caso do consumidor, recomendamos que o usuário de aplicativo fique atento ao GPS do entregador após fazer um pedido, para garantir que vai ter contato apenas com a pessoa correta. Infelizmente, não há como o cidadão comum identificar na rua quem é entregador de verdade e quem não é. É uma massa muito grande [de trabalhadores e pessoas usando mochilas-baú]. Há uma série de medidas que estão sendo estudadas atualmente para identificar melhor os profissionais, com sinalização e uso de QR Code, mas até o momento ainda não temos isso. A nossa recomendação de segurança é, em caso de assalto, as pessoas não reajam e entreguem o que for pedido”, afirma o delegado Nico. Ele informa que não há um padrão de abordagem dos bandidos. Alguns utilizam armas, outros simulacros, e a atuação ocorre principalmente na cidade de São Paulo, mas já atinge todo o Estado.
No final de abril, um outro caso de assalto por um falso entregador chamou a atenção na capital paulista após terminar na morte do jovem Renan Silva Loureiro, de 20 anos, uma das vítimas do crime. Ele e a namorada foram roubados à mão armada. Toda a ação, que durou poucos segundos, foi registrada por câmeras de segurança de uma casa no bairro Jabaquara, onde tudo se passou. O rapaz chegou a se ajoelhar e colocar as mãos na cabeça, mas reagiu em seguida para tentar proteger a namorada, quando foi atingido por um tiro disparado por Acxel Gabriel de Holanda Peres, de 23 anos, que foi identificado e preso pelo crime quatro dias após o ocorrido.
Após o caso Renan e por causa do aumento no número de crimes desse tipo, no primeiro final de semana de maio, as polícias Civil e Militar realizaram uma ação conjunta para encontrar suspeitos de assaltos de bandidos que fingiam ser entregadores de aplicativo. Segundo a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP), os agentes abordaram 743 motos, 13 automóveis e 81 bicicletas na capital paulista entre sexta-feira, 29, e sábado, 30. Nove pessoas foram detidas, mas o motivo das prisões não foi informado.
O que dizem as empresas usadas como disfarce
Questionado pela reportagem, o iFood disse que repudia quaisquer práticas de criminosos que prejudicam a imagem e o trabalho dos entregadores. “É inaceitável que criminosos se aproveitem de uma atividade honesta para praticar crimes contra a sociedade. Esse tipo de conduta não representa e não pode ser atribuída à categoria de entregadores”, defendeu a empresa. A marca também informou que está colaborando com o governo do Estado de São Paulo para encontrar soluções que auxiliem a atuação do Poder Público na identificação de criminosos que se passam por entregadores para cometer crimes. “Este trabalho é essencial para preservar a imagem e o trabalho honesto de milhares de entregadores que atuam com a plataforma, bem como garantir a segurança de clientes, parceiros e da sociedade em geral”, aponta.
Sobre o uso de mochilas-baú com a logomarca da empresa, o iFood informou que não exige o uso de tal equipamento com essa característica para que alguém faça entregas pela plataforma. “O fato de uma pessoa estar utilizando uma bag com a marca do iFood não significa que esteja fazendo uma entrega pela empresa ou ainda que possua cadastro nesta. Sobre a bag, o entregador cadastrado pode comprá-la no iFood Shop atrelado ao seu CPF inscrito no sistema”. A marca informa ainda que o cadastro exige a inclusão de documentos que variam de acordo com o veículo da entrega e que todos os dados são averiguados para verificação da pessoa que se cadastra.
“Periodicamente, ativamos uma ferramenta de reconhecimento facial como uma medida de segurança adicional para coibir o aluguel e empréstimo da conta e proteger o entregador honesto em nossa plataforma (…) Caso seja confirmado que o cadastro do entregador esteja sendo utilizado para prática de atividades ilícitas ou descumprindo o Termo de Uso da Plataforma, as providências cabíveis são tomadas imediatamente”, declarou o iFood. A reportagem também tentou entrar em contato com outras marcas de delivery, mas não obteve sucesso com o Rappi e o James. O Uber Eats informou que já não está mais em atividade há dois meses.
Direito do consumidor?
De acordo com a advogada Rossana Fonseca, nos casos em que alguém é assaltado por um falso entregador que utiliza objetos com o emblema de aplicativos de delivery como estratégia para enganar a vítima e se aproximar dela com mais facilidade, fingindo ser um entregador de verdade, as empresas não podem ser responsabilizadas judicialmente pelo crime e nem terão a obrigação de indenização. Para ela, nem o Código do Consumidor e nem o Código Civil fornecem elementos capazes de responsabilizar a empresa em crimes como esse.
“O direito de ir à Justiça é constitucional. Qualquer cidadão tem o direto de buscar a Justiça caso entenda que teve um direito violado. No entanto, numa situação como essa, em que o sujeito foi roubado por alguém que portava uma sacola de uma determinada empresa, isso por si só não é suficiente para garantir a ele uma indenização. É quase como ser roubado por alguém que usava uma camiseta de um time de futebol. O Código de Defesa do Consumidor impõe responsabilidade ao fornecedor no caso de vício no produto ou serviço, mas é preciso que haja uma relação jurídica entre ambos, consumidor e fornecedor. Havendo essa relação, a responsabilidade passa a ser objetiva, ou seja, independente de culpa da empresa. E não parece que seja o que ocorre nessa hipótese”, explica Rossana.
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